porque você sabe que essas coisas não começam – quando elas chegam elas já são tanto, já são demais. E elas transbordam em nós, e nós transbordamos por aí.
E vai ser isso: eu vou transbordar por aí. As pessoas vão me ver por esse brilho que eu sobro, por esse sorriso idiota, porque estarei longe, alto, pendurado ao corpo mas flutuando longe dali, como o balão na mão da criança.
E vai ser isso: eu vou ser uma criança. Porque a criança é o excesso do adulto – e isso só porque o adulto é velho demais pra saber que é o contrário, que ele sim é o excesso da criança. Mas eu, enquanto for hoje, enquanto houver nós, eu serei a criança, excedendo de minha adultice finalmente, ainda que provisoriamente, curada.
E vai ser isso: mais que isso. Mais que eu. Vai sobrar, esparramar por aí; majestosa, clara, leve, leitosa, espalhafatosamente.
Vai ser o amor, o subversivo, magnânimo e destrutivo, o único digno do nome.
E vai ser isso: não vai ter nome. Vai corroer as coisas caberem em suas cascas, vai transpor as coisas de suas casas, vai ser pra lá do limite de tudo que é, pra que tudo possa ser, finalmente, mais do que é, o que é o mesmo que efetivamente ser o que é.
E vai ser mais, bem mais que isso. Porque essas coisas, que bem não começam, também não terminam, quando muito explodem, piram matam machucam morrem, mas terminar, terminar nunca terminam.
Tem que ser mais que isso: vão me virar do avesso, e me pendurar num balão, acima da minha cabeça, e eu vou beber até que alguém me esqueça, correr mudar pra que ninguém mereça, pois tudo sobra até que alvoreça, e tudo casca até que arboresça, habita o oco até virar em vão.
E a morada,
a morada do amanhã,
que é nunca e mais que sempre nunca
vai enfim chegar,
espalhafatosamente.