Tenho tentado me manter ocupado. Tenho tentado matar o tempo, a ver se o tempo me mata.
Tenho estado distraído em tribulações nebulosas,
pensamentos confusos, fixações desgostosas.
Tenho pensado em nós.
Tenho lembrado de um tempo que acho que nunca foi.
Tenho habitado ondas mornas de fotografias de você,
Esperando que me veja,
querendo estar contigo,
sabendo que no fundo,
[ou na superfície,]
eu já te perdi.
Já desde sempre.
Desde que estivemos juntos.
Talvez nunca tenhamos estado juntos.
Já há um tempo,
acho que já desde sempre,
Tenho estado confuso.
Será que você existe?
Tenho andado perdido pela casa.
Tenho recolhido trapos e bugigangas que me lembrem de que se trata.
Tenho pensado em mim, e em você.
Acho que me perdi de mim, em você,
e quando você deixou de estar comigo em si, e quando foi-se,
– quando foi? –
desceu a foice:
Cortou-me o nome,
o tempo o feito o trato o jeito;
cortou a luz que me iluminava o peito.
Fiquei tão-só
Tão só pra num eterno momento,
fiquei a sobra de um eterno momento,
tão só pra num eterno momento,
viver procurando indícios de te ver chegar.
Tenho tentado me manter ocupado
De ti.
Tenho te visto rodando em falso,
em mim,
em falso,
e você, que me conhece como nunca, bem sabe o que eu falso em mim.
Tenho tentado me manter ocupado, à espera do tempo
em que você viria
E tenho recolhido trapos,
E sinais e retratos
Convencendo a mim mesmo
De que você existia
Tenho tentado me manter ocupado
Tenho juntado as escassas forças,
Tenho resistido, insistido e tentado
E então,
na derradeira hora
Toda vez você,
esse resto largo que é você,
Invade e arrasa e conquista e mata
E restamos, uma vez mais:
Eu (o que resta de mim)
E você (o resto que resta de você).
Mas haverá um dia um dia
– só o pensamento me arrepia –
Um dia maior que eu e nós e, deus o queira,
Maior que você.
Até lá,
desde aqui e ao largo desse longo mesmo nosso tempo,
Até lá estarei ocupado, ocupando, o culpado.
Errâncias 