Da beira do mundo plano

   … e tendo sido quase tudo por medo de não ser ninguém, à beira do caminho vê um engano; abaixando-se para alcançá-lo, percebe com curiosidade e espanto, ao levantar, que esqueceu-se, no caminho, o que deveria ter sido.

   Onde ficou?

   Revolve a terra de onde pegara o engano. Não, não está lá. Onde estará?

   O que seria de si sem o destino que anunciara a todos? O que faria da publicidade e do inevitável e de toda aquela exuberância, arremessável ao infinito quase sem perda estética?

   As chances eram muitas, e ainda assim, quando falava de uma boca que poderia muito bem não ser a sua, percebeu que devia ainda algo de si àquilo que dizia. Era, afinal, alguém. Mas quem? Com certeza não era aquilo que perdera quando se abaixou para pegar o engano; se fosse aquilo, não teria perdido aquilo, e nada disso fazia sentido.

   Mas e o engano, onde estava? Estava com ele, em algum lugar (nesse momento remexia os bolsos). O engano… como era, mesmo? Já não o sabia, mais – já não sabia a si, já não sabia mais o engano.

  Olhando-se a esse outro que agora era seu corpo, e pensando-se a si como os eruditos pensam-se em termos conceituais, viu-se encarnado em peça de Beckett, e riu: fora a glória, e fora futuridade, e via-se hoje tornado em corpo-outro e em exuberante insano.

  Era-se mais de si, com essa ignorância pouca que torna plausíveis os entendimentos puros e práticos e universais.

  [ em uma banca de jornal com grandes anúncios de belas revistas, vira que Stephen Hawking defendia, hoje, que é impossível compor uma equação que represente a natureza; só resta ao físico morrer, de fato ]

  Ah! Via-se voltando a si.

  Porque, afinal de contas, a loucura e a desilusão são fugazes, são mais espectros que presenças, são mais arremessos do que estâncias.

  E é uma vida pouca.

  …

  cadê?

9 de novembro de 2010

Um comentário em “Da beira do mundo plano

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