Se um verso, face aparente de um sonho qualquer, dissesse de mim mais do que o que eu sou,
(Ou se dissesse de mim não mais que tudo que importa),
Se ele me atravessasse as farsas, os impasses e os disfarces,
Ele, a frente esquecida do verso de mim.
Se um verso meu me pudesse sonhar de mim aquilo que para além de mim me define; se ele pudesse dizer enfim o que eu, por não sabê-lo, por vezes esqueço,
Se esse verso me chegasse e eu presto corresse, se eu o alcançasse e ele à face minha mirasse
(minha? ou de um outro?: um engodo qualquer ),
estaríamos postos de malas prontas, cheias de acasos e de força e de gente amada guardada firme na memória e nos bolsos junto ao peito.
Se versasse da história um verso em que isso enfim acontecesse, eu decerto abraçaria esse meu verso
Nos lançaríamos em ímpeto – um só futuro lastreado em tantos corpos – e estaríamos então, uma vez mais, face ao infinito,
Aquele que une as pontas ao acaso e as relança,
infinitamente,
Do diverso ao que importa,
diverso que seja,
único sempre,
nosso se tiver que ser
Mas esse verso,
é claro que eu não o tenho.
Pois que ainda que seja meu, ele decerto não me pertence:
É um verso meu que vai por aí,
Perdido e encontrado nos encontros quais sejam,
Nos acasos da vida,
Na perdição,
Numa esquina,
Em você.
E quando, por vezes, ele me encontra comigo,
Eu me vejo, eu diverso, eu disperso,
um acaso encontrado pro que me toca e atravessa,
meus versos em festa, rimando sem pressa, sem arte e com graça
Os versos trançados de tanto Nós.
Nós que somos diversos, nossos versos dispersos, desperdidos por aí,
Multiplamente unos em tudo que para além de nós nos une:
Um começo esquecido, acasos repartidos,
Nós tantos,
Versos em frente,
esquecidos do fim